segunda-feira, agosto 20, 2012

SINTONIA


Posso garantir que não foram poucas. Por incontáveis vezes eu questionei o mundo, as pessoas, Deus e a mim mesmo em relação aos encontros e desencontros da vida moderna. Quem nunca questionou? Qual de vocês nunca se perguntou para onde foram os sentimentos, a sinceridade, o respeito, o amor? Entre tanta modernidade, aonde se esconderam os encantos, a entrega, aquele romance simples, doce e insubstituível entre homens e mulheres? Por que afinal de contas, viver um amor verdadeiro e construir uma relação sustentável tornou-se algo tão inatingível na vida contemporânea? Alguém e inclua aqui seu terapeuta/analista/psicólogo/psicanalista, te deu uma resposta capaz de silenciar suas interrogações? Lamento dizer, a mim não.

Acredito que todas as interrogações que podemos nutrir no percurso de nossas vidas partem sempre de um ponto comum: nós mesmos. Não há meios de se exigir do mundo e dos outros uma resposta, se em contrapartida estamos vazios, se não temos conosco nossa própria resposta em relação a eles. Assim, diante da sem graça falta de cor e perante a tamanha falta de amor com que tudo se apresenta, só um caminho se abre a nossa frente. Ácido. Transparente. Solitário. Mas completamente essencial ao relacionamento humano de qualquer natureza, o auto conhecimento.

Nos últimos quatro anos e fumaça, enquanto minha cabeça exercitava a paciência e meu coração canceriano insistia em fantasiar expectativas fracassadas, vivi um relacionamento sério comigo mesmo - uma autêntica viagem de auto conhecimento, entendimento e aceitação. Passeando por cada um de meus defeitos, visitando minhas carências, acatando de forma serena a minha própria imperfeição humana. É simples? É fácil? É leve? É superficial? Não, não é não. Primeiro pela ausência da fantasia e ilusão - as quais estamos imbecilmente acostumados a fabricar, engolir e achar normal, parte integrante da vida. Segundo porque esta relação se dá apenas entre você e você. Não existem quaisquer tipos de terceiros ou fatores externos habitando, intervindo e conduzindo seus pensamentos e principalmente, seu coração. Não existem mais baladas ou festinhas da moda anestesiando seus pensamentos e sentimentos sobre sua própria vida. Não, se você aceitar se conhecer. Não, se você se defender da sociedade e das suas fórmulas mágicas - que te levam sempre aos mesmos lugares vazios. É você e você numa relação que se dá pelas vinte e quatro horas que o dia tem. Dormindo e acordando, vivendo juntos e interagindo o tempo todo. Sem férias. Sem afagos. Sem mentiras. Sem colo. Sem açúcar. E nessa hora, todas as verdades que você tanto esperou ouvir dos outros, se espelham em você mesmo. Quem é você afinal? O que você deseja de verdade para sua vida? Você pergunta a si mesmo. Pergunta e responde. Pergunta e reconhece que falhou demais, que já mentiu, iludiu e se iludiu demais. Falhou demais. Mentiu demais. Sonhou demais. E um milhão de vezes se esfolou com seus próprios sentidos. E um milhão de vezes se machucou ao esperar dos outros o que não entregou a si. Mas assim aprendeu! Mas assim virou gente adulta e bem resolvida! É daí que vem a sabedoria, o crescimento e a maturidade. É daí que você olha pra trás e se orgulha de estar vivo - de ser, apesar de todos os erros e defeitos - uma pessoa do bem.

Aceita uma coisa, vai… É sempre de dentro pra fora! É do coração para cabeça que tudo flui e se torna sustentável a nossa volta. Só existe verdade no que você diz e faz, quando você está em sintonia com você mesmo. Sem essa conexão, teoricamente óbvia e na prática, muito rara - nada é sustentável - nada é real - seus gestos, seus atos, sua voz, tudo se resume utopia. É só depois. Sim, é algum tempo depois de que você se olha no espelho e sabe - sem artimanhas - quem você é e o que você quer de verdade, que você se torna capaz e digno de amar a si e por conseqüência, a qualquer outro ao seu redor. É depois de saber o que você quer, o que você não quer, o que aceita e o que jamais irá aceitar - que você encontra o amor, o amor por você mesmo. A pré-condição sentimental para amar o outro.
 
Você questionou. Você insistiu. Você buscou se conhecer e acabou conhecendo o amor próprio. Agora ficou fácil, né? Não. Agora ficou mais difícil do que já foi um dia, do que é por natureza. Agora, você não tapa o sol com a peneira. Agora, você não usa ninguém para calar sua carência ocasional, você se usa. Agora, você sabe em pouco tempo, ao presenciar pequenas atitudes - o que pode crescer e o que jamais vai passar da condição de semente. Agora, você promete menos, sonha menos e respeita em igualdade com o seu, o sentimento do outro. Noite eterna? Oi e tchau? Foi bom, mas acabou? Render o quê? Render pra quê? A química é afinada, mas e o resto? O que é o resto - se o resto é tudo que você não aceita, não quer e não admira? Restos? Agora, você anda feliz na sua própria companhia. Agora, ainda que só - você conhece a mesmice do fim de cada balada - e entendeu de um jeito doce (e não com a sensação de exclusão) que não existe ali um final que combina com você. Que nenhuma delas vai trazer entre um e outro gole de vodka, alguém com quem você vai passar mais de uma noite. Agora, você é feliz - ainda que deseje um amor e não tenha - e só vai aceitar os sentimentos que cheguem pra somar, pra te tornar alguém mais feliz e melhor. Agora, amizades, noites e flertes, se abrigam num mesmo pacote - só se tornarão parte da sua vida, se forem reais, se tiverem a essência afinada com a sua.

Eu sei, companheiro! Bunda seduz. Peito seduz. Vestido mostra útero seduz. Seduz quem quer um troféu. Seduz quem quer uma noite. Seduz qualquer ser que tem o tesão como objetivo singular - como se a vida se resumisse numa odisséia sexual. Depois que você se conhece, depois que você se ama e descobre o que quer - o que te seduz é a sintonia. Sintonia de essência. Sintonia de horizontes. Sintonia de pensamentos. Sintonia de cheiro, de respeito, de amor próprio. Sintonia… Essa menina rara, que brinca de esconde-esconde. Que parece impossível, que se mostra ausente dia após dia - e que numa hora, num segundo, num verdadeiro passe de mágica - desce do céu e te mostra que os desencontros valeram, que todos erros e tudo mais aconteceu do exato jeito que tinha que ser. E então, finalmente, sua fé em Deus e cada uma de suas prosas com ele ganham um sentido maior - não parece que é amor - não tem jeito nem cara de amor - é amor, apenas amor - e isso basta.
Fiquem bem e se cuidem.
Beijos,
Deco. 
*: Desculpem a ausência longa. O tempo anda muito corrido e algumas sementes que renderiam bons textos acabaram escapando mais curtas pelo Facebook. É bom estar de volta! Obrigado pelo carinho de sempre.